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Desvendando a hierarquia das entidades nacionais e regionais

Por:

Nayara Simões

- 02/08/2021

hierarquia

No universo das entidades médicas, há hierarquias de diferentes níveis. Uma delas é a relação de regulamentação entre Conselho Federal de Medicina (CFM) e demais entidades. Outra a se evidenciar é a hierarquia científica entre as sociedades e a Associação Médica Brasileira (AMB). Com essa relação são desenvolvidas provas para obtenção do título de especialista, assim como a validação de diretrizes científicas no Brasil. Uma última hierarquia que deve ser realçada é a existente entre algumas entidades nacionais e regionais. Afinal, quais são os pontos positivos e os negativos de se estabelecer essa relação?

A resposta para esse questionamento pode ser analisada em diferentes vieses. Isso porque cada entidade deve avaliar o cenário de acordo com sua preferência e forma de trabalho. O angiologista e cirurgião vascular Bruno Naves, presidente da Sociedade Brasileira de Angiologia e Cirurgia Vascular (SBACV), defende a existência de hierarquia. “Ter regionais em um país dessa dimensão é fundamental. As diferenças entre regiões são grandes – precisamos centralizar as demandas do associado na nacional, mas é por meio das regionais que essas demandas são acatadas, filtradas e, se for o caso, repassadas para a nacional”, defende.

Ainda segundo o especialista, a hierarquia entre as nacionais e regionais é determinante na Medicina. “Não existe uma sem a outra. Elas não competem, mas somam. A equação é a do “ganha, ganha”, na qual tudo que é feito é bom para a nacional e para regional, e vice-versa”, explica. Hoje, a SBACV mantém uma relação de liderança entre as entidades regionais de Angiologia e Cirurgia Vascular. Dessa forma, parte das finanças reunidas pelas regionais é direcionada aos serviços da federal, que defende os interesses dos médicos das especialidades em todos os âmbitos e regiões.

Resultados de uma relação não hierárquica

Em contraposição à SBACV está o Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO), que tem alcançado resultados positivos em sua atual forma de trabalho não hierárquica. De acordo com José Beniz Neto, presidente da entidade, a relação entre o CBO e as demais sociedades estaduais, regionais e as temáticas é de cooperação. “Isso ocorre por terem em seu âmbito de estudo o trabalho de atualização científica em áreas da Oftalmologia. Cada uma delas constitui uma pessoa jurídica autônoma e administrativamente independente”, detalha.

Segundo o especialista, a grande vantagem desse tipo de constituição é a autonomia das instituições, o que permite que cada uma delas seja capaz de atender seus associados e oferecer serviços pertinentes a sua realidade. Como forma de atrair o associado e ainda valorizar as regionais, o CBO tem dois programas de suporte e cooperação com as sociedades de Oftalmologia. “O primeiro, focado nas sociedades temáticas, é denominado ‘Somos Todos CBO’, e o outro, ‘CBO + Perto’, responsável por promover essa aproximação e o suporte que as sociedades estaduais precisam”, revela.

Beniz Neto explica que esta última iniciativa é composta por três frentes:

  • Educação continuada;
  • Apoio à gestão;
  • Apoio à comunicação – as sociedades estaduais contam com toda a infraestrutura de marketing do CBO.

Quando questionado sobre a existência de algum plano voltado para a construção de uma hierarquia entre as entidades no futuro, o especialista informou que uma das marcas das sucessivas gestões do CBO é a eterna busca por aperfeiçoar processos e serviços oferecidos aos associados. “Isso significa que estamos também em busca por apoiar cada vez mais as sociedades estaduais e as temáticas, pois vemos nelas a capilaridade do trabalho do CBO, tanto no que se refere aos serviços que prestamos aos médicos quanto o que fazemos em prol da saúde ocular da população”, assegura.

Prós e contras

O Universo DOC também conversou com o advogado Guilherme Portes, sócio da Portes & Carrada Sociedade de Advogados. O especialista falou um pouco sobre os prós e contras de uma relação hierarquizada e explicou que considera a hierarquia entre as entidades médicas regionais e nacionais importante para a definição de diretrizes únicas de atuação.

Para o especialista, as regionais, em geral, têm uma capacidade reduzida de colaboradores e profissionais, de modo que as estratégias capitaneadas a nível nacional se traduzem em uma soma de esforços em prol de um objetivo comum. “Quando todas as regionais falam a mesma língua, a narrativa certamente será mais forte e contundente”, assegura.

Segundo Portes, um exemplo são os atos de defesa profissional, que geralmente envolvem as operadoras de planos de saúde, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) e os conselhos profissionais. “Esses players do setor precisam ser demandados, combatidos e/ou notificados em todo o país, e essas ações devem ser tomadas pelo grupo com base em uma estratégia geral única, de modo a evitar interpretações e provimentos conflitantes”, explica.

Portes acrescenta, ainda, que uma eventual atuação descoordenada, pautada em estratégias entendidas como acertadas, com base nas convicções individuais de cada entidade, podem trazer prejuízos irreparáveis para a classe médica. “Embora as convicções sobre diversos temas sejam mutáveis no tempo e ensejem, eventualmente, divergências pontuais, a pauta deverá ser sempre única e seguida por todos”, defende o advogado.

Como ponto negativo da hierarquia, Portes cita a possibilidade de a nacional utilizar-se de sua posição hierarquicamente superior para suprimir ou reduzir a participação das entidades regionais na definição das estratégias de atuação. “As regionais, por sua própria natureza, possuem maior conhecimento acerca das características da sua localidade, o que não pode ser ignorado pela entidade nacional”, pontua.

Além disso, ele destaca que essa eventual restrição na participação também pode facilitar diferenças políticas entre as entidades. “Enquanto parte de uma estrutura maior, há a necessidade de um tratamento isonômico e cordial entre todos os seus integrantes, situação que geralmente carrega uma alta carga de subjetivismo, até mesmo pelas diferenças sociais, regionais, entre outras”, alerta.

Por fim, Portes explica que a criação de sociedades regionais permite à entidade de âmbito nacional conhecer melhor as diferentes características e dificuldades de cada localidade. “Essa capilaridade também permite congregar um número maior de associados, o que é determinante para fins de representatividade da categoria”, sustenta.

Cuidados ao estabelecer hierarquia

Em linhas gerais, a hierarquia pressupõe a existência de regras de relacionamento entre as entidades de determinado grupo. O ponto central é definir as competências, limites de atuação e forma de relacionamento entre essas entidades.

Segundo Portes, essas definições devem ser estabelecidas, preferencialmente, por meio de documento escrito, que, a depender da estrutura jurídica dessas entidades, poderá ser no estatuto social, em termo de cooperação, convênio ou qualquer outra modalidade. “Estabelecidas as regras, torna-se possível às entidades exigirem umas das outras o seu cumprimento, o que torna o relacionamento mais transparente e objetivo”, conclui.

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