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Quando o atendimento digital se transforma em distanciamento

Por:

Alice Selles

- 10/01/2020

Toda mulher com mais de 40 anos precisa, pelo menos anualmente, realizar alguns exames de rotina, que incluem exames laboratoriais (sangue), mamografia e ultrassonografia. Como a imensa maioria, sou meio relaxada com relação aos prazos e adoraria que alguém me lembrasse (sugiro que os serviços de diagnóstico por imagem invistam neste tipo de marketing de relacionamento).

Na falta de um serviço com o lembrete dos meus sonhos, escolho (escolhia) para realizar os exames solicitados por minha médica uma clínica que eu considerava especial, por ter escolhido um foco bem preciso para suas atividades: definiu-se como uma clínica para mulheres. Teoricamente, dispensou de sua potencial clientela os pacientes do sexo masculino, mas escolheu oferecer um serviço diferenciado.

De posse dos pedidos dos exames, fui buscar o telefone da clínica (onde já havia realizado exames por dois ou três anos) em seu site. Lá encontrei uma página de agendamento on-line e pensei: “Ótimo! Resolvo tudo aqui, agora”.

A primeira decepção foi que a página não era propriamente de agendamento: há uma mensagem informando que, após  reencher os dados solicitados (informações pessoais e sobre os exames pretendidos, médico solicitante e unidade preferencial de atendimento), uma atendente entrará em contato para finalizar o agendamento.

Fiz isso em 2 de agosto, uma quinta-feira, e fiquei esperando o contato. Apenas no dia 6, na segunda-feira seguinte, recebi não um contato, por um dos três telefones que disponibilizei, mas sim, a lacônica mensagem que reproduzo aqui:

Em resposta ao seu e-mail, gostaríamos de esclarecer que nossa Central de Atendimento possui uma dinâmica intensa.

O (nome da clínica, a qual me recuso a fazer propaganda do serviço) está exposto a um número elevado de ligações por dia e marcações por e-mail.

Devido à tamanha demanda, não temos horários livres para agendamento. No momento, só estamos dispondo de horários para os exames de densitometria óssea, mamografia, biópsia e ressonância magnética. Para ultrassonografias, somente por desmarcação. Continuamos à disposição e agradecemos pela preferência.

Imediatamente pensei: “Como assim? Alguém ainda entrará em contato para agendar o outro exame ou me avisar sobre alguma ‘desmarcação’? Não há horário para agendar até quando? Fui rejeitada”? Achei a atitude absurda e me vi diante de dois caminhos, não como profissional de Marketing, mas, sim, como cliente: ligar ou escrever para eles e reclamar; ou ignorar e buscar outro serviço, pois uma clínica que trata pacientes com tamanho desleixo não é o serviço que procuro. Decidi pela segunda opção, mas quis trocar minha experiência com outras pessoas interessadas em marketing e em serviços médicos.

Afinal, será que os serviços de saúde que estão oferecendo agendamento on-line de fato estão preparados para essa inovação? Pensaram em todas as etapas e nas possíveis falhas que um serviço como esse pode apresentar?

Em minha opinião, é fundamental entender que, apesar de todas as facilidades tecnológicas disponíveis hoje, nada substitui o principal diferencial que qualquer serviço de saúde pode ter: o acolhimento. Acolhimento não se faz com tecnologia: se faz com gente.

Um telefonema em vez de uma mensagem padrão seria fundamental para mostrar que o serviço em questão de fato se importa com seus pacientes. Não consegui deixar de pensar em quantas outras pacientes receberam a mesma mensagem que eu, em quantas pessoas não perderam, no mínimo, a oportunidade de ligar para outros serviços no dia em que entraram em contato inicialmente, em virtude da estúpida demora no envio de uma mensagem padrão.

A dica de Marketing que fica deste episódio é simples e vale para quaisquer relacionamentos: não se proponha a fazer o que não é capaz. Agendamento on-line ou resolve a vida do cliente ou o irrita e o afasta, queimando uma imagem que provavelmente levou anos para ser construída.

Artigo publicado originalmente na Revista DOC #24, em 2012.