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Você sabe como funciona a estrutura da sua sociedade?

Por:

Bruno Aires

- 10/01/2020

Apesar de estarem afiliados a uma sociedade de especialidade, muitos médicos desconhecem a estrutura da própria associação e o que essa estrutura pode trazer de benefícios para sua carreira

Para Vera Fonseca, atualmente presidente da Comissão de Residência Médica da Associação de Ginecologia e Obstetrícia do Estado do Rio de Janeiro (SGORJ), o grande problema é que muitos profissionais não sabem quais são as funções de uma sociedade de especialidade. “O médico acha que a associação existe só para oferecer um congresso ou um curso e nada mais. As sociedades afiliadas à Associação Médica Brasileira (AMB), que são reconhecidas de fato como tal, têm funções muito importantes”, defende.

Vera, que já presidiu a própria SGORJ e atuou por dez anos como secretária-geral da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), enfatiza que as sociedades existem para garantir o reconhecimento da especialidade e a educação médica continuada. O que acontece, segundo ela, é uma falta de conhecimento do médico quanto a isso. “A gente só ama o que conhece e temos que conhecer o que uma sociedade faz para querer se associar. Com a sociedade, o médico terá sua educação continuada, inclusive em questões como defesa profissional, ética e outros temas”, afirma.

Para cumprir essas funções, as sociedades mantêm estruturas, geralmente, muito parecidas. Abaixo do seu presidente, a sociedade geralmente tem um ou vários vice-presidentes, um secretário-geral (cuja função é ocupada por um médico) e um tesoureiro. De acordo com a estrutura da sociedade, podem existir, ainda, secretários adjuntos e tesoureiros adjuntos. Além disso, há diretores em áreas específicas de atuação da sociedade, como a diretoria científica e a diretoria profissional.

“Todo trabalho que uma sociedade faz é para tentar ajudar o desenvolvimento profissional de seus associados. Por isso, existe uma estrutura organizada. Há um núcleo central, composto pela diretoria, e uma equipe administrativa, formada por profissionais fora da área da Saúde e que garante o funcionamento da entidade. Isso sem falar nas comissões, que se formam para discutir, conversar e propor mudanças sobre um determinado tema, como defesa profissional, eventos, publicações, ética, ensino médico, residência e saúde suplementar”, explica Vera.

Segundo Sergio Meirelles, diretor de Patrimônio da Sociedade Brasileira de Angiologia e Cirurgia Vascular (SBACV) e secretário-geral da regional Rio de Janeiro da SBACV, essa estrutura básica se repete em muitas sociedades. “Na SBACV, por exemplo, temos o presidente, o secretário-geral, o tesoureiro-geral e cinco diretores (científico, de Eventos, de Publicações, de Defesa Profissional e de Patrimônio), além de seus respectivos vices”, lista.

O que Meirelles enfatiza, porém, é que, apesar desses cargos serem essenciais para o funcionamento da sociedade, nem todo profissional que assume tais funções está preparado. “Em geral, esses cargos não são remunerados. Essa acaba virando uma atividade totalmente amadora, feita por pessoas não preparadas profissionalmente para isso. O que acontece é um esforço do médico de se adaptar e uma determinação de ser útil para sua sociedade”, acredita.

Estrutura básica das sociedades

Não há um padrão estabelecido que as sociedades de especialidade adotam para definir suas estruturas. Porém, alguns cargos são comuns e podem ser encontrados em grande parte das entidades. São eles:

  • Presidente
  • Vice-presidente (ou vices)
  • Secretário-geral (ou diretor administrativo)
  • Tesoureiro
  • Adjuntos (secretários e tesoureiros)
  • Diretoria Científica
  • Diretoria Profissional (para temas, como defesa profissional, ética e saúde suplementar)
  • Comissões técnicas e científicas
  • Equipe administrativa (secretária e outros profissionais)
  • Assessorias e consultorias externas

Engajamento necessário

Além de conhecer melhor a estrutura da sociedade de especialidade, os dirigentes concordam que há algo que precisa ser mais incentivado junto aos médicos: o engajamento. “Uma sociedade forte enfrenta melhor os diversos desafios que seus sócios encontram no seu dia a dia, principalmente na defesa de seu mercado de trabalho, na luta por honorários médicos dignos junto às fontes pagadoras, em seu aprimoramento científico e no adequado atendimento à população. Mas uma sociedade forte só é possível com o engajamento de quem compõe a sociedade”, defende o diretor da SBACV.

As comissões científicas podem ser uma importante porta de entrada do médico na estrutura da sociedade de especialidade. Muitas entidades precisam de pessoas, principalmente mais jovens, para integrar essas comissões e trazer novas ideias e experiências para debater propostas para serem deliberadas pela diretoria. “Quando se engaja em uma comissão, seja ela técnica ou profissional, o médico tem a oportunidade de participar de um grupo de colegas para uma determinada atividade e, assim, aos poucos, se sente mais capacitado para colaborar com a sua especialidade”, completa Meirelles.

De acordo com o advogado Guilherme Portes, sócio da Portes & Carrada Sociedade de Advogados e responsável pela assessoria de Saúde Suplementar do Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO), o primeiro passo importante para o médico se engajar com a sociedade é, sem dúvida, o conhecimento sobre a própria entidade à qual se associa.

“Na comissão de Saúde Suplementar do CBO, muitas vezes, são encaminhados questionamentos que já foram respondidos no site da entidade. Então, se o associado entrasse no site e entendesse o que faz essa comissão, veria que já existe muita coisa disponível, como pareceres e outros documentos, à disposição dele para consulta.

Nos congressos, tentamos mostrar ao associado o que faz cada comissão do CBO. Mas existe médico associado há 20 anos que nem sabe que existe uma comissão de Saúde Suplementar. Ou seja, as pessoas não usam os recursos simplesmente porque não sabem que eles existem”, lamenta Portes.

Outro ponto que o advogado levanta é em relação às sociedades regionais, cujas estruturas, em geral, são menores que as entidades nacionais. “A experiência que tenho com regionais mostra que muitas não têm autonomia política e econômica para se organizar no mesmo nível da nacional.

Então, a maioria não consegue ter muitos recursos para os associados. Algumas nacionais se aproximam das regionais para oferecer a estrutura que elas não conseguem atender sozinhas. Isso é bom para os dois lados, afinal, a nacional não consegue estar presente o tempo todo em todos os lugares e se faz mais presente por meio das regionais”, explica.

Funções primordiais das sociedades médicas

As sociedades de especialidades possuem funções bem definidas em seus estatutos. Basicamente, toda entidade médica cumpre (ou deveria cumprir) as seguintes obrigações:

  • Ser filiada à AMB;
  • Realizar a prova para conceder o título de especialista;
  • Promover a educação médica continuada;
  • Incentivar o engajamento do associado nas questões relacionados a sua especialidade;
  • Investir no suporte a questões inerentes à prática médica, como defesa profissional e saúde suplementar;
  • Lutar pelos interesses dos seus associados;
  • Realizar periodicamente eventos de atualização, como congressos, simpósios, jornadas e cursos;
  • Quando possível, dar auxílio às sociedades regionais.

Prioridades para os médicos residentes

Não importa se estamos falando de uma sociedade nacional ou regional: o desconhecimento do médico em relação à estrutura das entidades médicas é generalizado. Com isso, falta engajamento de boa parte da classe médica. Uma solução que muitas entidades descobriram e vêm investindo bastante nos últimos anos é no envolvimento maior do jovem médico, ou seja, o profissional que acaba de entrar no mercado de trabalho.

“Essa é uma discussão que se tem e não se encontrou um melhor caminho para isso. Os médicos mais jovens estão interessados em conquistar seu espaço na Medicina. Então, acabam relegando para segundo plano a aproximação com a sociedade de especialidade. Muitas vezes, eles não veem a importância dessas sociedades ou não sabem nem qual é o real papel delas”, critica Guilherme Portes.

Para Sergio Meirelles, é primordial que as sociedades invistam, cada vez mais, no esclarecimento do jovem médico. “É preciso explicar, principalmente, a importância de uma sociedade que defenda sua especialidade e, consequentemente, o defenda em sua prática profissional. Ele deve entender a importância de participar ativamente dessa luta, independentemente se ocupa um cargo”, ressalta.

Vera Fonseca acredita que o jovem médico promove uma “oxigenação” na sociedade médica. Afinal, as cabeças pensantes, em algum momento, precisam sair da diretoria da associação, e elas dão espaço, justamente, para os mais jovens. “O que o médico tem que pensar é o seguinte: de onde vêm as pessoas que chegam à diretoria da sociedade? Pois é: começam como um simples associado, que depois de um tempo começa a doar parte do seu tempo em prol do bem-comum dos seus colegas de especialidade”, diz.

Para o jovem médico, Vera gosta de contar sua própria história de vida para exemplificar. “Recém-formada, me associei e fui chamada para participar de uma comissão. Depois, coordenei uma comissão, fui secretária-geral e presidente de uma sociedade regional, até chegar a ser diretora administrativa de uma sociedade nacional. Tudo isso começou quando entendi que aquele meu trabalho poderia beneficiar muitos colegas e, por consequência, um grande número de pacientes”, resume.